quinta-feira, 19 de setembro de 2013

SENHAS

Meu computador exige a senha
sanha de controle
Indefinível
Eu sou eu mesmo?
Senha para o banco
(da praça também?)
Senha para cartão
para o protocolo
para o atendimento
No consultório
no poupa-tempo
Senha para o pensamento
a emoção
o sentimento,
já imaginou?

Senha para os versos
- acho que deveria
haver o tal controle
para a poesia...
A criação hoje é expressa
como vida atual
não dá tempo de ler
de se espantar
de degustar a poética
Já vem um novo poema...
Antes a gente parava
relia
refletia

Pátria Minha
foi um (dos muitos) poema que me tomou de assalto
e parei no verso
“Porque te amo tanto, pátria minha, eu que não tenho
Pátria, eu semente que nasci do vento
Eu que não vou e não venho, eu que permaneço
Em contato com a dor do tempo, eu elemento
De ligação entre a ação o pensamento
Eu fio invisível no espaço de todo adeus
Eu, o sem Deus!”
e fiquei sem fôlego
e fiquei sem ação
e fiquei
fui, voltei
continuei
ao menos um mês nesse poema,
nenhum outro cabia
e ainda tenho ele dentro de mim...

Diferente dos tantos poemas que leio
(leio muitos, alguns muito bons)
mas já atrás vem outro
e outro
e mais um, do mesmo autor
e já não sei o que li
o que senti
A compulsão de escrever tira o valor
A publicação instantânea tira o sabor
Poema é como o sol de cada dia
vem e fica visível em períodos
a exposição deve ser moderada
penetrar a gente e ficar
quarando.


Use no mínimo 16 caracteres
alterne entre maiúsculas e Minúsculas
e números e sinais
assim: Nova\012345/Poesia 
e envie só uma por dia!

terça-feira, 10 de setembro de 2013

do VERSO INTERATIVO

a cada Ovo,
um grito
um escândalo
uma afronta
pena que voa,
pena que ela não voa
que não seja leve como os pássaros
que seu canto não seja mavioso
ao invés de rancoroso
invejoso
indecoroso...
num poleiro coletivo
num puteiro privativo
o verso interativo jamais é impositivo,
poetas amam a vida que não vivem
poetas são românticos e não realistas
há mais paradoxos que afirmações
há mais intenções que realizações
poetas são poucos, e não se juntam
eu não quero viajar o mundo
(como eu já fiz)
eu não quero ser visto
(senão como espelho)
eu não quero ser conhecido
(por quem não me conhece por dentro)
eu quero um poema mundano
e vaidoso e perdulário e suntuoso
que alguém leia e goste
que alguém leia e se incomode
que alguém leia e cuspa sem culpa
e esse cuspe brilhe ao sol.
Chamemos isso de poesia concreta-

-interativa.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

VÁCUO

Um buraco, eu acho
então existe...
liga à superfície ao escuro
é duro, profundo, liso e absurdo

uma cratera é grande
gigante, imerge na paisagem
liga a terra ao ar...
aspirar e sufocar, arder

um vazio é conceitual,
animal que se sabe o vulto
avulso, avilta, anima
o ser em crer, em querer

o vácuo é o tudo
onde nada falta porque nada há,
nada perece
nada cresce nem diminui
nada para nem flui...

o tudo permanece
onde se crê que nada exista
onde nada se vê
onde nada é nada
e persiste, eterno.

criamos o nosso vácuo
daquilo que chamamos amor.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

RETÓRICA EROTIZADA


retórica erotizada
palavra emancipada
língua afrontada
fada?
anja?
mulher ahhhLada...
é na terra que te planto
é em teu colo que me planto
pronto desde o começo
pranto que desconheço
na ventura de sua asa
a felicidade atrasa
porque... não quer par_ t_ir
a realidade nos arrasa
prá que mentir?
pelo-poro-pele
a sua
é pura
és santa
és puta
grita-geme-encanta
autocracia da palavra
deambula poesia
erosmania... é mania de voce... 

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

JOGOS DE PROCURA

O movimento lento
dos jogos de procura
em ser a antítese 
do nada

confirmada por astros,
os mastros eretos
como deuses fálicos,
válidos argumentos
antiparnasianos,
insanos monumentos
à conjunção,

conspiração das luzes
pela ausência de solidão,
seduzidos, os sedutores
interrompem os subterfúgios:
suspenso o espaço
calado o tempo,
amado me faço
te amo se tento,

sou só o sol louco que
não sabe onde nascer,
és a lua linda
que me faz saber,

que a poesia,
neste longo instante
de querer, é você.

sábado, 17 de agosto de 2013

O meu PÁSSARO AZUL

meu pássaro azul
está semimorto,
já o libertei, ele se prende
a mim, que o criei
ao seu mundo, que sou eu
triste pássaro
que sobrevive de mim
azul no cinza
azul na noite
azul na merda
de que lhe vale ser azul?

meu pássaro azul,
a boca enche-se de prepotência
ao vociferar o possessivo: meu
a boca enche-se de porra
que é tudo o que sobra depois
que o sexo acaba,
azul pálido
azul desamor
azul refalsado
de que me vale ser ele azul?

meu pássaro azul
aprendeu a voar, mas não voa
- voar é tudo o que podemos
vá, pássaro enfeitado
enfeitar a iniquidade
enfeitiçar a sobriedade
foder a felicidade
azul mórbido
azul delinqüente
azul da gente
de que nos vale sermos azul,

se só voamos latrina abaixo?

domingo, 11 de agosto de 2013

PAI


dormi pai
acordei papai

cada dia é assim, somos mais
soma-se o pai, o filho e o ventre santo
multiplica-se o amor, o cuidado e orgulho quanto...

pai 
não dorme
não come
não relaxa
acha graça
acha o brinquedo
esconde o medo
esconde o frio
põe a mesa
põe a máscara
tira a máscara
tira a mágica

pai,
o herói sem asas, sem super-poderes
o amigo,
justo e injusto, à beira do caminho
flor e espinho, bronca e carinho

Pai, agora...

deixa o computador e vem brincar!

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

A CACHOEIRA DOS MEUS SONHOS

                                                               foto: aburton


Foram tantos longos tempos necessários
em andança,
Dentro de mim até onde cria o fim
Começava onde se perpetuava a criança,
imemorial lembrança

De templos satíricos,  castelos líricos
As imagens lúbricas, vontades únicas

Fui o errante solitário, fui o guerreiro
sem descanso,
O culpado de todas minhas culpas
O inocente dos pecados cometidos
em honra à liberdade,
A maldade como arma contra o mal
do manso.

Tive grandiosos mirantes,
mares por espelho,
Desertos ao meio
meio raio, meio vilão,
A poesia nas mãos

Que ensinou ao olhar o olhar,
Que soube sentir ao vir
A beleza que os amantes temos

Sob o Monte de Vênus.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

POESIA NO VARAL

                                                     clique na foto para ampliar

quarta-feira, 24 de julho de 2013

CONSIDERAÇÕES SOBRE A PATERNIDADE

Paiê. Do berço me espiam dois olhinhos, os braços apontados em minha direção. Corro buscá-la, abraçá-la, infinitos beijos e apertos, cantos e risos, e assim é o início diário de mais um dia.

E minha convicção? A sentença de pedra que, a exemplo de Nietszche, proferi? “Filhos, não quero tê-los, jamais os terei”. Como tudo que digo é resultado de uma reflexão, de muita reflexão, da impressão de leituras, do que me fica das conversas, do que aprendo dos exemplos, que Hugo afirma não ser a melhor coisa da vida, mas a única, das análises e exercícios de futurologia, explico como cheguei a esta afirmação.

Somos humanos, temos de crer nisto. Somos animais, somos espécie, por mais evoluída (os naturalistas podem achar que menos) que seja esta espécie, funcionamos como todas as demais da fauna terrena, nosso impulso primordial é a perpetuação. Com sete bilhões de pessoas habitando, neste exato momento, este mundo, a raça humana pode dispor de mim para sua continuação (imaginem, neste mesmo exato momento, quantas crianças estão sendo geradas, nas alcovas do mundo afora).

Descartado este primeiro motivo, o fundamental, o segundo, existencial, vai-se fácil. O desejo de ter filhos é o ápice de nosso egoísmo, precisamos de alguém para incutir nossos valores, para ser a nossa imagem e semelhança, para realizar nossas frustrações. Eu sou tão egoísta, que nem isto quero partilhar.

Pronto! Filhos, melhor não tê-los! E eu parava por aí a leitura do Poema Enjoadinho. Mas tive uma filha, e façam-me um favor, não queiram entrar neste mérito, vasculhar a história, o que acontece em uma cama ardente, cabe só a quem se incendeia.

O que está posto agora é, o que virá? O mundo continua sua degradação (lembram-se, eu dizia há vinte anos atrás que da Patagônia à fronteira norte do México seria apenas uma única favela – e será – com pequenas ilhas de civilidade - será?- , e o jardim amazônico devidamente internacionalizado), o homem cada vez mais vil, o tal vil metal que cada vez mais poucos vêem, a superstição e a fé mística avançam mais que o conhecimento científico, embora este se multiplique à velocidade dos ultra-mega-super-giga-bytes.

Este é o mundo e este é o conhecimento que darei para Marina. É justo? Hoje ela está a crescer e aprender, coordenação motora, inteligência espacial, o que mais encanta, e diverte, e necessário, é o aprendizado da fala, da língua. Já evoluiu muito, nossa linguagem é quase comum: o que para mim é bola, ela chama de bóia; a chupeta é peta, blusa é uda; você é ôce (reminiscências de Ibitinga); Chico é kiko, carro é carrô, travesseiro, amplitude, gnóstico, licenciosidade, constitucional, para ela é tudo arrrg, urghh, oooorg, ergggh.

O que fará ela quando souber que o computador se chama computador? Tendo conhecimento do nome das coisas, faz-se imperioso ter consciência da utilidade das coisas, e saberá que um computador computa (!!!!), pensa em bytes, tem memória, periféricos, programas, linguagem, e é usado para processar textos, efetuar cálculos, editar imagens. Certamente ela não irá mais abri-lo, sentar-se sobre o teclado, apertando todos os botões à mão, divertindo-se com os sons e as figuras que alternam-se na tela. Ela trela, por que não sabe o que é isto.

Seria negligência minha se não a ensinasse, se não procurasse todos os dias preencher as lacunas da estante, para que ela tenha para ler todos os livros que devem ser lidos; se não tocasse um rock, um blues, no interlúdio de seus discos infantis; se não me detivesse para olhar uma rosa, rodear um aquário, imitar os pássaros, banhá-la no pacífico e no atlântico, navegar no tiete e escorregar nas cachoeiras de minas, para compor um ser que atinja à aspiração pedida por Goethe, depois de três mil anos tenha o saber, e possa fazer suas próprias escolhas.

Papai, mamá! E lá me vou a preparar-lhe o leite, que toma já enrodilhada nos meus braços, um suspiro de satisfação, o desenho de um sorriso nos lábios, olhos fechados, dorme neném, que na ausência de deus (nem isto posso lhe dar), teu pai vela seu sono, e sussurra às estrelas para que desçam aos seus sonhos.


Canto de Ninar (Raul Seixas)

Nada tão belo como uma criança dormindo
Nem tão profundo como dormir sem sonhar
Nem tão antigo como o sonho dos teus olhos
Nem tão distante como a hora de acordar

Dorme enquanto teu pai faz músicas
Que é a forma dele rezar
Todos os sonhos na realidade
São verdades, se eu puder cantar

Você chora quando tem fome
Mas vem logo uma mamadeira
Amanhã se você chorar
Vai chorar tua vida inteira

Fiz meu rumo por essa terra
Entre o fogo que o amor consome
Eu lutei mas perdi a guerra
Eu só posso te dar meu nome
 


Ao Nosso Filho Morena (Oswaldo Montenegro)

Se hoje tua mão não tem manga ou goiaba
Se a nossa pelada se foi com o dia
Te peço desculpas, me abraça meu filho
Perdoa essa melancolia

Se hoje você não estranha a crueza
Dos lagos sem peixe da rua vazia
Te olho sem jeito, me abraça meu filho
Não sei se eu tentei tanto quanto eu podia

Se hoje teus olhos vislumbram com medo
Você já não vê e eu juro que havia
Te afago o cabelo, me abraça meu filho
Perdoa essa minha agonia

Se deixo você no absurdo planeta
Sem pique-bandeira e pelada vadia
Fujo do teu olho, me abraça meu filho
Não sei se eu tentei mas você merecia

terça-feira, 23 de julho de 2013

CINCOS ANOS



A vida respira e pede
...Marina

A flor do meio-dia
A cor do amanhecer
A melodia do riso
... o paraíso

O mel de seus olhos
Olham o mundo crescer
Vêem a gente bonita
Os bichinhos medonhos
... os sonhos

De aprender palavras
De dizer poesias
De correr meninices
Desenhar nossa imagem
... maquiagem

Batom, esmalte  e pose
De princesa
De coelhinha
De você, nossa pequenina
... Marina


(o “s” em cincos não é licença poética, é como Marina pronunciava os números quando estava a aprender a contar... dizia: “eu tenho quatros anos e vou fazer cincos anos... agora fez, e está a fazer rimas... outro dia me perguntou: “pai, você não vai?... e com aquela cara que criança faz diante de uma descoberta: “rimou!”... considero esse seu primeiro verso...)


23/07/2013

RASCUNHO DE GENTE



um raio de sol
uma semente
lua nova
borboleta
gotas de chuva
botão de flor
acorde de blues
amanhecer

rascunhos
de versos
de cores
de gente

riso
dança
festa
fogueira de São João
o vale do Douro
olinda
ainda mais bela
será ela

tudo o que renasce
nasce com Marina
a pequena estrela bailarina.


“somente quem tem o caos dentro de si
pode dar à luz a estrela bailarina”
F. Nietzsche

  
23 de julho de 2008 


sexta-feira, 19 de julho de 2013

IRREVERSÍVEL

se tento o impossível
menos consigo

entender
aceitar

o mundo crível
o mundo imundo
 em que nasci

por improviso
acidente
sem motivo

à toa
ao léu .

se tento o possível
menos consigo

viver a vida

reta
abjeta

que dizem ser o caminho.

caminho no meu eu

insano
risível

irreversivelmente perdido

de tudo que não há em mim.

terça-feira, 16 de julho de 2013

TU, UTENTE

abrir-lhe as partes
para tomar posse...
da parte que me cabe

penetrar-lhe com o verbo
para ouvir seu corpo
repetir substantivos gozos...

a língua queima
a gruta reage, no líquido que emerge
para tangenciar o ardor

molhada outrora
lambuzada senhora
cavalga ilhargas anímicas

as minhas, que jamais foram suas
ou serão... senão nesse instante

senão nesse verso...

quarta-feira, 10 de julho de 2013

A PELE E A MENTE

a pele dá tesão
encosta, arrepia, queima,

é só ato
movimento, estertor.

a pele pede e toma
sacia-se e vai embora,
só se assanha a tez
se a encontra outra vez.

ou talvez a consumação a consuma.
perde o encanto, não há mais o que
se fantasiar,
torna-se ato.

a sedução ideária não.
não é seu corpo que pede,
é sua alma que deseja.

ficamos mais excitados com uma bela
narrativa que com um toque caliente
então eu pergunto,

eu te provoco?
onde?
no suor do lábios?
no arrepio dos seios?
no desvio do olhar?

é sua pele a provocada?
ou são seus pelos?
serão suas ousadas mãos?
ou a flor que lhe nasce abaixo do ventre?

as coxas, as costas, os dentes?
ou te provoco toda desde a mente?

o que sente?
quando a voz rouca manda-lhe ficar calada
mas o olhar intenso que vai e vem
causa-lhe gritos...

safada
amada
tarada?

eu te provoco?
quando?
ontem
hoje
e sempre?
agora, em que as palavras
te penetram lentamente
e gozas plenamente?
gozo solo em tuas próprias cavas

e tu, sabes o que me causas?



sexta-feira, 5 de julho de 2013

UM CÁLICE DE CICUTA

espero que jamais seja tarde
 sobre sempre o tempo necessário,
o emissário negro se atrase
e possamos nos reconciliar com nossas renúncias,
as denúncias de que amamos pouco sejam retiradas
- amaremos tanto que esqueceremos o que é amor,
as desculpas que pedimos sejam ignoradas
- fizemos o que fizemos, não há o que refazer;
as dores que causamos sejam recuperadas
- tudo é dorido, pensar dói, não se acaba,
as palavras que proferimos sejam ouvidas
- não pedimos que sejam compreendidas, apenas ouçam, ouvidos moucos, ouçam!

e se já for tarde, fiquemos um pouco mais
o arroz vai queimar
o trem vai sair
a musica vai acabar
o dia vai escurecer
e nós aqui, entre um gole de esquecimento e uma porre de isolamento
o tédio engrandece uma vida,
o que eu fiz, o que eu não fiz, o que eu quis?

planos para o passado alimentam a alma vazia
a alma que dói, dor de ter vivido cedo
c a n s a d o cedo, amado sempre
perdido no quando...

eu quero voltar a medir meu tempo pela emoção
- pelo tesão
por aquela sensação de arrogância e ambição e desespero
de quem não espera,
esses a morte não alcança, eles vão à lança
trespassados, transidos, translúcidos
sentados à poltrona de uma ampla varanda burguesa
à tarde, vento morno, sol poente avermelhado
parece poesia, quem vê aparência
nada sabe da essência inconformista,
do que não fala o que não escuta

- esse é o poeta
ai dele!
ai dele!
que jamais seja tarde

para um brinde de cicuta.

segunda-feira, 1 de julho de 2013

CATARSE


Observei dois sonhos que se beijavam,
um feito de amor o outro ausente de ódio;
lindos emocionaram-me,
puxaram duas lágrimas gêmeas.

Nascedouros, o mesmo sentimento,
caíram, todavia, de diferentes olhos
 que tinham o mesmo olhar para
as lágrimas que se afastavam.

Sorri um meio sorriso,
todo ele de esperança que a dor fosse
de fato fingimento,
porque não o sendo, seriam duas dores:
uma de sofrimento e a outra de desilusão.

Parei de pensar e não morri,
parei de morrer e não vivi;
parei de esperar e não cheguei,
parei de chegar e não encontrei;
parei de procurar, só não parei de parar. 

Escrevi a carta de despedida
mas não consegui me dizer adeus,
pedi a deus que me fizesse crer
nele e em seu mundo;
rompi com os homens porque não os teria,
rompi com as mulheres porque as queria.

Desta catarse sobraram poucos pedaços,
os que caíram marcam minha estada no tempo
dos que ficaram farei meu recomeço no espaço,
afinal, eu sou meu sol,

e ainda há muitas auroras por acontecer. 




quarta-feira, 26 de junho de 2013

O GRITO

Eu deixei um grito
Longo, dorido, infinito
Corrido num labirinto
Um grito humano
Grotesco grito

De quem morre ainda vivo
De quem vive ainda sem amor
De quem ama ainda com pudor
De quem pode e perde o mito
De quem come e descome o livro
Passeia preso e passivo
Atônito elide o grito
Surdo ouve o apito
Soluça, sufoca, sofre
E repete o grito

Ouviram o grito?
Viram este grito?
Andaram com o grito?
Gritaram meu dito?
Alguém responda, eu acredito
Não tenho fé, mas necessito

Perdi meu grito
À favorita de Diana repito
Devolva-me o grito
Não podes fugir de Juno o castigo
Estou mudo?
Estou aflito
Reflito...

O eco é um som refletido
Dentro de uma cabeça oca
O som entra, bate e volta,
Então meu grito deveria ser ecoado
Ad infinitum
Meu mundo de gritos e paradoxos
Cabeças-ocas não me ouvem
O som entra mas não sai
Fica no altar das paralelas
Um dia voltaremos a ficar juntos
Eu e o meu grito,

Ouvindo o ovo gritar.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

O OLHO QUE SE ISOLA

Olho um olho que se isola
Longe no tempo, extrapola
O que realmente desejo ser.

Como me ver tão fora de mim?

Assustado com o que fazer
Com as respostas que darei,
Compromissos ambíguos que
Demarquei, intimidades expostas
Que desrespeitei.

Não posso me observar,
Deixo o caminho ao caminhar
O gosto ao paladar
O amor ao se dar
Nada sei antes de começar.

Tentarei, lembrar-me-ei minhas
Matas queridas, as cachoeiras
Descidas, os vôos de moto,
Os sons de um blues, os poemas
Líricos, os encontros oníricos.

Viajandando,é o estado que se
Encontram os românticos
Existenciais pós-modernos
Idealistas eternos.

Borboletando, é como ficam
As palavras desconexas que
Saem do peito sem motivo,
Até se encontrarem na verde
Folha, poema sem escolha.

Eu ando, mas só quando
Chegar é que saberei

Onde quis estar.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

AGORA, SOMENTE PARA QUEM TEM NAMORADA

Para quem tem namorada, não dessas atuais,
Que ficam hoje e amanhã, nada,
Falo para àqueles que em um dia de sol
Ou numa noite enluarada, descobriram
Seus olhos noutros olhos, nos quais soube ser a amada.

É para esses venturosos que desde então jamais caminham sós
Que alerto, não seduzam a si, oh sedutores,
Que estas donzelas se dão, nos beijam, suspiram,
Juras eternas redundam, ardem, esperam,

Porém se não cuidadas não toleram
E o que antes era amor torna-se bolero.

Assim, o amor conquistado não é como a bandeira fincada
No topo do mundo ou na vastidão da lua,
É antes, já disseram os poetas, uma flor desabrochada,
Que requer calor, umidades e delicadeza, muita atenção
Chocolates, minos e champanhe gelada.


Um fim de tarde na praia, acordar (e não levantar) numa manhã
De outono, lareira no inverno, a alma sã cheia de pensamentos
Impuros, um e-mail de bom-dia, trinta telefonemas nas horas mais
impróprias, a palavra leve, o pronome torto dito constantemente:
                      Eu te amo, eu te amo, eu te amo.

Ame, companheiro, mas amar não basta, é preciso cuidar do amor

E conquistar a amada a cada dia, para que o amor dure todos os dias.

terça-feira, 11 de junho de 2013

PARA QUEM TEM NAMORADA - E PARA QUEM NÃO TEM

hoje eu amo o outro
,este outro ser divergente que há em mim
eu o amo em desespero de ser também por ele amado...
- porque preciso que alguém me ame como eu amo
,que meu amor seja enfim retribuído em
                sua totalidade
                          sua complexidade
                                        sua intensidade...

eu amo em línguas que jamais ouvi
se na minha o termo para todos 
... os amores 
,é único 
no grego tem três palavras
(o que antes era sofismo, depois de ágape virou modismo)
bom mesmo é em irlandês
são dezoito palavras para dezoito tipos de amor
 - com tantas pronúncias haverá tantas possibilidades 
de se ouvir AMOR
,que uma há de me atingir...


 ah, já posso ouvir o oblíquo torto:
eu te amo
- quem me ama?
- que importância pode ter?
saber que sou amado
,que amo
,que o mundo é uma bola azul
e o pote de ouro no fim do arco-íris me espera antes mesmo de meu fim que,
             pode ser hoje
                            pode ser agora
                                           pode já ter acontecido...

eu queria ser amado
- e sou
 eu queria amar para ser amado
- e amo
 e o amor tanto já veio e tanto já se foi
,que hoje eu amo o outro

este outro ser divergente que há em mim...

domingo, 9 de junho de 2013

EXCALIBUR

havia um pedaço de pau fincado na lama
ninguém era capaz de removê-lo, pois ficava
fora do alcance do caminho florido

um dia um menino agredido pela ordem das coisas
ferido pelas cores, pelos aromas e sabores
maltratado pelos pássaros e pelos anjos
entro na poça e retirou o velho cajado

saiu ao sol e viu as gentes distantes irem ainda mais longe
percebeu que o pedaço de pau
transformou-se numa espada
o barro que secou sobre sua pele formou
a mais dura armadura
nascia o cavaleiro do lodo
o anti-herói predestinado a combater o mundo
claro e ordeiro

derrubou reis
venceu duques e clérigos
violentou princesas
indignado sentiu-se amado.

era um homem de posses
possuía um pedaço de pau e um pouco de lama
tinha vestes e ouro e posição
exposição
mulher amante e profissão
cidadão
correto altivo e orgulhoso
cansado sentiu-se odiado.

o velho se refugiou numa torre
além das nuvens
ali guardava suas lembranças
a falta de fantasia e esperanças
as aventuras as amarguras a indolência
não tinha mais sonhos nem dissabores
perdera os amigos e os inimigos
extasiado soube-se ignorado.


morreu entediado e feliz